A intencionalidade do conhecimento | Por Edmund Husserl

A intencionalidade do conhecimento | Por Edmund Husserl*

“É momento agora de definir a natureza da classificação brentaniana e, portanto, a do conceito de consciência, entendido como ato psíquico.

(…) Das duas definições por nós privilegiadas, a primeira indica diretamente a essência dos atos ou dos fenômenos psíquicos. Ela se impõe de modo inconfundível exemplos quaisquer.  Na percepção é percebida alguma coisa, na representação imaginativa alguma coisa é representada em imagem, na enunciação alguma coisa é enunciada, no amor alguma coisa é amada, no ódio alguma coisa é odiada, no desejo alguma coisa é desejada etc. Brentano pensa o que se pode reunir de comum nesses exemplos quando diz: ‘Todo fenômeno psíquico caracteriza-se por aquilo que os Escolásticos da Idade Média chamaram de inexistência intencional (ou também moral) de um objeto e que chamaremos, não sem alguma ambiguidade, referência a um conteúdo, direção para um objeto (e isso não quer dizer que se trate de uma realidade) ou então objetualidade imanente. Todo fenômeno psíquico contém em si alguma coisa como objeto, embora nem sempre de igual modo’. (…)

O fato de que se considere a classificação brentaniana dos ‘fenômenos psíquicos’ mais ou menos adequada, ou então que se chegue a reconhecer que ela tem para toda a psicologia a importância fundamental que seu autor genial pensava que deveria lhe ser atribuída, não é aqui muito relevante. Apenas uma coisa deve ser salientada pela importância que ela detém para nós: há diversas modalidades específicas essenciais da referência intencional ou, em poucas palavras, da intenção (que representa o caráter descritivo genérico do ‘ato’). A modalidade em que ‘mera representação’ de um estado de coisas ‘entende’ este seu objeto é diferente da modalidade do juízo que assume este estado de coisas como verdadeiro ou falso. E diferente de ambas é também a modalidade da presunção e da dúvida, da esperança ou do temor, da satisfação ou da insatisfação, do desejo ou da repugnância; da decisão de uma dúvida teórica (decisão judicativa) ou de uma dúvida prática  (decisão volitiva no caso de uma escolha cujos termos se equivalem); da confirmação de uma opinião teórica (realização de uma intensão judicativa) ou de uma intensão volitiva (realização da intensão volitiva), e assim por diante. Sem dúvida se não todos, ao menos a maior parte destes atos são complexos vividos, e muito frequentemente as próprias intensões são múltiplas. As intensões afetivas baseiam-se sobre intenções representacionais ou judicativas etc. Mas não há dúvida de que , dissolvendo esses complexos, chegamos sempre a características intencionais primitivas que, em sua essência descritiva, não podem ser reduzidas a vivências psíquicas de outro gênero; e além disso, não há duvida de que a unidade do gênero descritivo ‘intensão’ (‘característica do ato’) exibe diversidades específicas que se fundam na essência pura desse gênero, precedendo, assim, como um a priori, factualidade empírico-psicológica. Há espécies e subespécies de intenções essencialmente diferentes. Em particular, é impossível reduzir todas as diferenças entre os atos de um tecido de representação de juízos, recorrendo simplesmente a elementos que não pertencem ao gênero ‘intenção’. Por exemplo, a aprovação ou a desaprovação estética é a modalidade de referência intencional que se demonstra com evidência e por ser essência peculiar em relação à mera representação do objeto estético ou ao juízo teórico a ela dirigido. sem dúvida, a aprovação estética e o predicado estético podem ser enunciados , e o enunciado é um juízo e, como tal, inclui certas representações. Mas então a intenção estética, assim como seu objetivo (Objekt) é objeto (Gegenstand) de representações e de juízos; ela mesma permanece essencialmente diversa desses atos teóricos. Atribuir validade a um juízo, nobreza a uma coisa afetiva vivida etc. pressupõe certamente intenções análogas e afins, mas não idênticas do ponto de vista específico. Assim também no confronto entre decisões judicativas e decisões volitivas etc. A referência intencional, entendia em sede puramente descritiva como peculiaridade interna de certas vivências, representa para  nós a determinação essencial dos ‘fenômenos psíquicos’ ou dos ‘atos’  de modo que consideramos a definição de Brentano, segundo a qual eles são ‘fenômenos que têm em si intencionalmente um objeto’, como um definição essencial, cuja ‘realidade’ (no sentido antigo) é naturalmente assegurada pelos exemplos. Em outros termos , simultaneamente a uma formulação  puramente fenomenológica: a ideação efetuada  sobre casos particulares exemplificativos de tais vivências – e efetuada de modo tal a excluir  qualquer posição existencial e qualquer  interpretação empírico-psicológica, levando em conta apenas o estatuto fenomenológico real  dessas vivências- nos apresenta a ideia genérica, puramente fenomenológica, de vivência intencional ou ato, e também suas especificações puras.”   

*HUSSERL, Edmund. Investigações lógicas. In REALE, Giovanni e ANTISERI, Dario. História da filosofia. vol. 6: De Nietzsche à Escola de Frankfurt. São Paulo: Paulus, 2006. P. 1195-96


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